Cine Club: Gritos e Sussurros de Ingmar Bergman (1972)

Olá, Idealistas :)
Bom resolvi seguir o exemplo da Debora dos Falsetes e
"mostrar cultura pra esse povo". E nada mais legal do que
estar fazendo pós-graduação em produção audiovisual,
e descobrir diretores incríveis de outros lugares :)
Então aqui vai uma resenha de um filme de Bergman.


O NOVO ESTILO DA EUROPA OCIDENTAL
            Nos anos de 1970, o mundo vivia uma grande reviravolta politica e social com o pós-guerra, refletindo está nova etapa também na arte cinematográfica, uma nova geração começou a entrar para este mundo das artes tirando o espaço da velha guarda das telonas. Em alguns países ocorreu de forma sútil como na Alemanha por não haver tantos veteranos, mas em outros lugares a mudança e a perda de mercado foram notáveis, tanto que grandes nomes como Luis Buñuel (1900-1983), Robert Bresson (1901-1999) e Ingmar Bergman (1918-2007) ainda estavam no seu ápice cinematográfico, um grande período para estes três. Bergman lançou sua obra Gritos e Sussurros, descrita pelo critico 

    Ricardo Cota do site CONTEMPLUS afirmando que Bergman declarou sua obra como:
“Um filme que se aproxima mais de um estado de alma do que propriamente de uma história a ser narrada dentro dos princípios básicos do cinema. Deixar transparecer o que se oculta sobre as formalidades das relações humanas é o objetivo dessa obra reveladora.”. (COTA, Ricardo, 2014. Contemplus).
            
    Heitor Romero crítico do Cineplayer diz que Gritos e Sussurros não é um drama de caráter intimista, é um estudo psicológico profundo:
“(...) uma imersão nos conflitos emocionais dos personagens, mas muita coisa no filme é apenas sugestão, ou apenas signos que ocultam intenções e sentimentos. Até porque Bergman sabia que era impossível e até pretensioso tentar esclarecer todos os sentimentos envoltos na relação de três irmãs.”. (ROMERO, Heitor. 2013. Cineplayer).
 Já o critico João Bernard da Costa, para o site Foco revista de cinema, declara que “Bergman dedicou este filme à mãe, cujo nome de solteira era Karin Akerblon. Karin é, no filme, o nome da personagem interpretada por Ingrid Thulin, àquela que se mutila numa sequência que ficou como “a pedra de escândalo” desta obra”.
            Mas enquanto alguns ainda conseguiam levantar voo, outros não tiveram a mesma sorte e declinaram, como Michelangelo Antonioni (1912-2007), sendo seu último filme relevante, segundo Kemp, Passageiro: profissão repórter (1975). Enquanto na Itália houve grandes perdas, na França a geração nouvelle vague, ainda estava a todo vapor e produzindo conteúdo distinto, como exemplo tem-se Claude Chabrol (1930-2010) com O açougueiro (1970) baseado em Hitchcock, e François Truffaut (1932-1984) com A noite americana (1973), mas foram desbancados pelo colega Eric Rohmer (1920-2010) e seus “seis contos morais”, que finalizou com O joelho de Claire (1970) e Chloe à tarde (1972).
            Nessa época tornou-se comum à abordagem nos filmes com questões sociais, politicas e históricas. Costa-Gavra (1933), de nacionalidade grega, mas naturalizado francês é um exemplo, em A confissão (1970), ele criticou os comunistas em Praga no ano de 1951, repetindo a ideia de criticas politicas também em Estado de sitio (1972) e Sessão especial de justiça (1975). Chocar e indignar eram palavras de ordem para Louis Malle (1932-1995), em Sopro no coração (1971), ele abordou a temática do incesto entre mãe e filho para a sociedade francesa, mas nada se compara com o escândalo que ganhou dimensões internacionais com, O último tango em Paris (1972) de Bertolucci, considerado obsceno pelos tribunais italianos por conta da presença do ator Marlon Brando.

GRITOS E SUSSURROS    1972
(Viskningar och rop)   INGMAR BERGMAN   1918-2007
PERFIL DO DIRETOR
1918-1946
Bergman nasceu em 14 de Julho, na Suécia, Uppsala. Iniciou sua carreira como diretor de teatro, especializado em autores nórdicos assim como ele. Estudou na Universidade de Estocolmo, em 1941 escreveu a peça teatral “Morte de Kasper”, mas foi em 1944 os primeiros traços de um dos seus filmes como roteirista, Hets (Frenesi), que abordava temas com amor juvenil, ciúme sexual e o ressentimento com as autoridades, apesar de ter dirigido algumas cenas do filme, sua estreia como diretor foi com Kris (Crise) em 1946.


1948-1953
Dirigiu mais alguns filmes entre eles Porto (1948), Sede de Paixões (1949), Juventude (1951), o qual o diretor considera seu primeiro filme, e Noites de Circo (1953).
1955-1960
Mas o filme que o consagrou para o mundo foi Sorriso de uma noite de amor (1955), que inclusive venceu o Festival de Cannes em 1956. Abrindo assim portas para a produção de uma das suas obras primas, O sétimo selo (1957) e logo em seguida Morangos Silvestres.
1961-1975
Em 1961 tem-se inicio a “trilogia da fé” com Através do espelho (1961), Luz de inverno (1963) e O silêncio (1963). No ano de 1966, veio sua obra mais indigesta e experimental segundo Kemp, Persona estrelada por Liv Ullmann, a musa inspiradora de Bergman, o que a fez protagonizar em nove filmes, além de terem uma filha.
1976-2002
Preso no ano de 1976, por evasão de divisas Bergman prometeu nunca mais trabalhar na Suécia. Exilou-se na Alemanha, mas acabou regressando a Suécia após alguns anos para rodar o filme Fanny e Alexandre (1982), no mesmo ano anunciou sua aposentadoria como diretor. Mas manteve-se ativo no teatro e na televisão, além de escrever.
2003-2007
Saraband (2003) foi o último filme de Bergman feito para a televisão, mas que acabou sendo exibido no cinema de vários países. Ingmar Bergman faleceu aos 89 anos, na sua casa em Faro.
      SOBRE: GRITOS E SUSSURROS
Sinopse: Em uma casa no campo, onde residem quatro mulheres. Entre elas duas irmãs Karin e Maria, que cuidam da sua irmã enferma e debilitada Agnes, com a ajuda de Anna que toma conta dos afazeres da casa e de Agnes, a qual tem uma relação quase que maternal. A partir deste contexto lembranças, medos, sonhos e eventos traumáticos invadem as personagens travam um sentimento de amor e ódio no interior de cada uma.


Bergman coloca em pauta uma das suas temáticas favoritas de suas obras: a futilidade do amor e a inacessibilidade da fé. Com um toque sucinto que remete ao conto clássico de Tchekov, que trata sobre três irmãs e a sua total falta de vinculo.
Marcado por um período de renovação na carreira de Bergman, afinal todos os seus filmes eram conhecidos por ainda serem preto e branco que segundo o próprio Gritos e Sussurros foi a exceção que merecia fugir da regra.
Com uma técnica impecável e indiscutível, com seus intensos flashbacks fluidos, o emprego quase que indispensável de close-up e o que dizer do majestoso e simbólico tom de vermelho que coloriza a película de uma forma dramática e intensa, criando um drama psicológico perfeito.
Segundo Philip Kemp,Tudo sobre o cinema, 2015, pg 324, “O diretor de fotografia, Sven Nykvst, experimentou por três semanas captar os diversos tons do vermelho – a cor do sangue, da paixão e (para Bergman) da alma- existentes no cenário.”
 O filme começa com background vermelho e os créditos de abertura no ritmo da trilha sonora inicial na qual lembra o passar dos ponteiros de um relógio, após a abertura o filme inicia com planos detalhes de ambientação fora da casa, mostrando o lugar com uma luz externa de tom frio e sem vida, com cortes seco para evidenciar a sucessão de imagens nestes minutos prévios.





 Com isso a câmera passa a se aproximar da casa e da vida das personagens com um fade out em tela vermelha, para associar a passagem de tempo e logo em seguida um fade in mostrando vários planos detalhes com movimentação de câmera em traveling por relógios de estilos diversos e com bastante utilização de fade in e fade out, até chegar o destino, o quarto de Agnes. 




 Ao entramos no quarto, nos deparamos com Maria, uma das irmãs dormindo e logo em seguida, para ambientação temos um plano aberto seguido de um close em Agnes deitada em sua cama acordando e sentindo dores.








 Ao abrir os olhos observa que sua irmã Maria dormiu ali lhe vigiando, então Agnes levanta percorre seu quarto, plano aberto, senta-se e escreve em seu diário contando quanta dor está sentindo naquele dia, plano detalhe nas mãos escrevendo no caderno, ao terminar ela regressa para cama e cena seguinte mostra a empregada, Anna, entrando no comodo da irmã que assistia Agnes,em um plano aberto. Em seguida, Karin, uma terceira personagem adentra a sala vermelha.

 Nesta cena, nota-se toda a dramaticidade que Bergman queria transparecer com o uso do vermelho em seu cenário. Para ele caracteriza-se como os elementos de destaque para o enredo e o entendimento da história o cenário, o vestuário das personagens e uso das cores com significados simbólicos para compreendimento psicológico. Já que Bergman negava-se a utilizar a cor como elemento dramático em seus filmes, por achar que o preto e branco simboliza de forma mais pura o drama.
 Mas com Gritos e Sussurros ele observou uma grande oportunidade de usufruir desta tecnologia. Basicamente três cores estão em destaque nesta obra: o vermelho, que para Bergman simboliza a cor da alma, o branco e o preto que simbolizam a pureza e o luto. E assim o filme segue com constantes utilizações de fade in e fade out com fundo em vermelho para simbolizar a passagem de tempo, seguido de maravilhosas movimentações de câmera em plano detalhe dos objetos e close das personagens para destacar suas constantes aflições, medos e dores.




 Nesta cena temos a primeira mudança de técnica que vem sendo feita desde o início, onde se tem a utilização do zoom, que consiste na câmera fixa e é o conjunto de lentes que se move fazendo com que o objeto, no caso Agnes, se apresente mais próximo, levando ao primeiro flashback de Agnes se lembrando de sua mãe e de sua infância, um meio recorrente durante o filme para compreender a história das personagens e o traçar de suas personalidades.


O primeiro personagem de fora da ambientação da casa faz sua primeira aparição, o Doutor, trazendo com ele mais um elemento cinematográfico o famoso, plano e contra plano mostrando que há um dialogo entre os personagens. Após o dialogo com Agnes, o doutor vai ao encontro de Maria que está a sua espera do lado de fora, neste momento temos a descoberta de um romance entre Maria e o doutor, que segue com um flashback de que tudo começou quando ele fora cuidar da filha de Anna, filha está que veio a falecer como subentendido nos momentos iniciais do filme. Maria era casada e tinha intenções com outro homem, seu marido se mata com uma faca e pede socorro a sua esposa para salva-lo, Maria simplesmente fecha a porta e se retira do lugar, o flashback finaliza com um fade out e a cena seguinte é o rosto em close de Maria, como se tivesse recordando. 


Finalmente temos a aparição da terceira irmã, Karin, em um dialogo de contra plano com Anna. Karin, aparentemente tem um presságio de que algo está prestes a acontecer.

Então nas cenas seguintes, ouve-se o chamado de Agnes por Anna, na qual temos a primeira cena de afeição plena e contato entre as personagens. Enquanto suas irmãs dormem, Agnes começa a passar mal. Suas irmãs vão ao seu encontro pelo chamado de Anna. Percebemos aqui, a total desafeição entre as irmãs, a partir deste ponto as cenas parecem ganhar movimento se tornam aceleradas, bem diferente dos minutos iniciais onde a sensação era de que o tempo passava lentamente, simbolizando o sofrimento de Agnes. Após a agonizante sequencia de dor, temos a primeira cena de cuidados e entrosamento das personagens, com o uso do plano americano.

 primeira mudança drástica de iluminação ocorre assim que Agnes vem a falecer, para aparentar passagem de tempo a luz vai amenizando até ter-se a sensação de luto e escurecer.





Após a morte agonizante de Agnes, temos o seu velório com constante planos detalhes e closes, para deixar evidente a expressão dos personagens e suas emoções. 


Karin tem seu flashback  em um jantar com o marido nada agradável, deixando evidente sua repugnância pelo conjugue. Após  este indigesto jantas temos  a clássica e agoniante cena, na qual ela introduz um caco de vidro em seu sexo, mutilando-se, segundo o critico João Bénard da Costa, está sequencia ficou conhecida como
 “ “a pedra de escândalo” desta obra e que, à época, meses antes do 25 de Abril, foi parcialmente e perversamente cortada pela nossa censura. Mesmo quando o não foi, muitos críticos a acharam extremamente exibicionista e houve quem muito se chocasse com o sangue que Karin vai buscar ao “orifício maldito” até o levar ao “orifício nobre”. E quem adjetivou desse modo os orifícios, dizia também que o sangue passava nesse plano “de la jouissance vers la parole”. ( DA COSTA, João Bénard, 2009. Foco revista de cinema)

Com uma trilha sonora composta basicamente por silêncio e som ambiente, para retratar a monotonia em que essas mulheres vivem, com algumas ressalvas geralmente com instrumentos suaves e recursos que remetem a badalas de relógio e o passar do tempo. Nas cenas de flashback são notáveis sons de sussurros, antes de mostrar o acontecimento passado. A obra é bela como um todo desde a fotografia até a montagem, Bergman certamente fez uma obra prima juntamente com Sven Nykvst e as atrizes que com indiscutível certeza aguentaram o close e não deixaram a desejar.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CINEPLAYER, 2013. Disponível em: <http://www.cineplayers.com/critica/gritos-e-sussurros/2605 > Acesso 13 Jul 2015.
FILMOW, 2014. Disponível em: <http://filmow.com/ingmar-bergman-a86070/ > Acesso 14 Jul 2015.
FOCO REVISTA DE CINEMA, 2009. Disponível em: <http://www.focorevistadecinema.com.br/FOCO1/benard-sussurros.htm > Acesso 13 Jul 2015.
GRITOS E SUSSUROS. Direção: Ingmar Bergman. Produção: Lars-Owe Carlberg. Suécia. Svenska Filminstistutet. Distribuição: Cinematograph AB, 1972. 1 DVD (106 min), NTSC, color. Título original: Viskningar och rop.
KEMP, Philip. Tudo Sobre Cinema. Rio de Janeiro: Sextante, 2011.
MILTON RIBEIRO, 2009. Disponível em: <http://miltonribeiro.sul21.com.br/2009/07/03/sobre-gritos-e-sussurros-de-ingmar-bergman/ > Acesso 13 Jul 2015.
REVISTA CAPITOLINA, 2015. Disponível em: <http://www.revistacapitolina.com.br/movimentos-cinematograficos/> Acesso 15 Jul 2015.
SIGNIFICADO DAS CORES, 2015. Disponível em: <http://www.significadodascores.com.br/significado-do-vermelho.php > Acesso 30 Jul 2015.

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